31/03/2009

A nova legislação europeia sobre o sector vinícola delineada pela comissária da agricultura Marianne Fischer-Boel, a ser ractificada no próximo dia 27 de Abril pela Comissão Europeia, está a causar polémica em alguns países. Nada que me espante! Nos países com longa tradição neste sector, nos quais Portugal se inclui , a prática de misturar vinho branco com vinho tinto para se obter um vinho rosé há muito que é proibida. Como sabem, o tradicional rosé é feito com uvas tintas que, ao serem maceradas, permanecem em contacto com as películas da uva (a pele) só o tempo suficiente para fornecer ao vinho a coloração rosada e a complexidade suficiente que é determinada pelo enólogo.

Michel Barnier, ministro francês da agricultura, já veio afirmar que mesmo no caso da ractificação da nova legislação, "a França proibirá a comercialização de vinho rosé produzido pela mistura de vinhos branco e tinto, por respeito à qualidade, às tradições vinícolas e ao consumidor". O que ele não diz é que tem os produtores franceses à perna por causa desta nova directiva e que a França é somente, o maior produtor mundial de vinho rosé.

Já há uns dias eu escrevi aqui o absurdo desta situação num mercado onde o vinho tem relevante importância nos países produtores do sul da Europa, quer em termos financeiros, quer em termos de tradição. Vamos então tentar deixar os "bairrismos" de parte e desmistificar esta situação!

A legislação de alguns países permite práticas que nós podemos, à partida, considerar absurdas. Um exemplo flagrante é o caso de alguns países do norte da Europa, como a Alemanha, permitirem legalmente a "chaptalização" dos vinhos brancos, que mais não é do que a adição de açúcar ao vinho na fase de fermentação. Não existindo horas suficientes de sol que permitam o amadurecimento das uvas na videira, adiciona-se açúcar ao mosto na fermentação para se conseguir um vinho com um maior grau alcoólico. Assim, a prática é introduzir artificialmente esse açúcar para prolongar a fermentação e aumentar o grau alcoólico do vinho.

Outro exemplo é o caso actual do vinho rosé misturado, acto legalmente admissível em alguns países do novo mundo. Simplisticamente, o mercado fornece ao consumidor o que é mais vantajoso renegando a qualidade do produto final para segundo plano. É a liberalização selvagem do mercado! Vejamos o que a "fabricação" de um rosé pela mistura de vinho branco com vinho tinto pode permitir:
  • Mascarar a qualidade - mesmo que um dos vinhos seja de qualidade inferior o outro pode-se sobrepor anulando os defeitos do primeiro;
  • Iludir o consumidor relativamente à qualidade final do vinho;
  • "Fabricar" vinho rosé em qualquer altura do ano, independentemente das estações e do clima;
  • Aumentar substancialmente o lucro dos produtores - quanto a mim é esta a razão principal!

Com a qualidade que os nossos vinhos possuem precisaremos de vinhos feitos desta forma?

Finalmente, eu gostaria de ver o nosso ministro da agricultura ao lado do francês. Apesar dos vinhos rosés não ocuparem um lugar de destaque no nosso consumo, é um problema que também nos toca a nós, directa e indirectamente!

Agora que a Primavera começa a aparecer, aproveitem para apreciar um bom rosé português, a acompanhar um prato de carnes brancas e magras grelhadas no carvão ou, somente, com uns morangos sumarentos e bem maduros!...

Artur Mesquita

3 comentários:

  1. Parabéns pelo magnífico artigo! Partilho inteiramente da tua opinião. É em grande parte devido a margens de lucro pornográficas de 100, 200 ou 300%, que a agricultura Portuguesa e em particular o sector vitivinicola está pelas ruas da amargura.

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  2. OOPS...Comentário certo no artigo errado. este comentário destina-se ao artigo "O Vinho e os Restaurantes"
    As minhas desculpas.

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  3. Não há crise. Conta a intenção!

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